O Clamor de Abandono: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”.
Por volta da hora nona (três da tarde), no auge de seu sofrimento na cruz, Jesus proferiu um clamor angustiante em aramaico, citado nos Evangelhos de Mateus e Marcos: “Eloí, Eloí, lamá sabactâni?”, que significa “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”. Esta exclamação, ecoando o Salmo 22:1, revela a profundidade da solidão que Jesus experimentou ao carregar o peso do pecado da humanidade, sentindo-se separado do Pai naquele momento crucial. Este clamor angustiante é um testemunho da intensidade do seu sacrifício e do mistério da sua união com a humanidade pecadora.
No clímax da sua agonia na cruz, por volta da hora nona, um grito lancinante rasgou o silêncio opressor do Gólgota. Em aramaico, a língua do seu povo, Jesus clamou com profunda angústia: “Eloí, Eloí, lamá sabactâni?”, palavras que Mateus (27:46) e Marcos (15:34) traduzem como “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”. Este clamor pungente ecoava diretamente o primeiro versículo do Salmo 22, um salmo messiânico que descreve vividamente o sofrimento e a aparente sensação de abandono do justo.
Este grito de Jesus é um dos momentos mais misteriosos e profundos da narrativa da Paixão. Ele revela a intensidade da sua solidão e a profundidade do seu sofrimento espiritual. Aquele que sempre havia vivido em perfeita comunhão com o Pai agora experimentava uma sensação de separação, um abandono que ia além da dor física da crucificação e da humilhação pública.
A razão para este sentimento de abandono tem sido objeto de muita reflexão teológica. Uma interpretação comum é que, naquele momento crucial, Jesus estava carregando sobre si o peso do pecado de toda a humanidade. O pecado, por sua natureza, separa o homem de Deus. Ao se tornar pecado por nós (2 Coríntios 5:21), Jesus teria experimentado essa separação de forma vicária, sentindo a angústia de estar alienado do Pai.
O Salmo 22, que Jesus cita, continua descrevendo um sofrimento extremo, zombarias, abandono e a sensação de estar entregue à morte. Ao proferir as palavras iniciais deste salmo, Jesus não apenas expressava sua dor presente, mas também se identificava com a profecia messiânica que detalhava seu sofrimento. Era um reconhecimento de que tudo o que havia sido predito sobre o Messias estava se cumprindo nele.
Alguns estudiosos sugerem que, ao clamar as primeiras palavras do Salmo 22, Jesus estava, na verdade, evocando todo o salmo na mente daqueles que o ouviam. O Salmo 22, apesar de começar com um lamento de abandono, termina com uma nota de confiança na vitória e na redenção. Assim, o clamor de Jesus poderia ser interpretado não apenas como uma expressão de desespero, mas também como uma afirmação silenciosa da sua fé final e da certeza da sua vindicação.
No entanto, a intensidade do clamor em si não pode ser minimizada. Ele revela a realidade do sofrimento de Jesus em sua totalidade, tanto físico quanto espiritual. Aquele que era plenamente Deus e plenamente homem experimentou a angústia de se sentir abandonado por Deus, um mistério que reflete a profundidade do seu sacrifício e a extensão da sua identificação com a condição humana pecadora.
O clamor de abandono de Jesus é um lembrete de que o caminho da redenção passou pela dor e pela solidão. Ele enfrentou a separação do Pai para que a humanidade pudesse ser reconciliada com Deus. Sua angústia na cruz demonstra o preço incalculável da nossa salvação e a profundidade do amor divino que se entregou por nós.
Em última análise, “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” é um grito que ecoa a profundidade do sacrifício de Jesus e o mistério da sua união com a humanidade pecadora. É um testemunho da intensidade do seu sofrimento e da sua total entrega ao plano redentor de Deus. Este clamor angustiante continua a nos desafiar e a nos convidar a contemplar a magnitude do amor divino manifestado na cruz.