A Continuidade e a Descontinuidade entre as Páscoas.

As celebrações da Páscoa judaica (Pessach) e da Páscoa cristã compartilham uma raiz histórica comum na libertação do povo de Israel da escravidão no Egito. No entanto, com o advento de Jesus Cristo, a Páscoa cristã evoluiu, mantendo certos elementos de continuidade com a tradição judaica, mas introduzindo uma descontinuidade fundamental centrada na pessoa e na obra redentora de Jesus, que é visto como o cumprimento final e o significado pleno da libertação. Este artigo explora essa complexa relação de continuidade e descontinuidade entre as duas celebrações.

As celebrações da Páscoa judaica (Pessach) e da Páscoa cristã estão intrinsecamente ligadas por uma história compartilhada de libertação divina. A Páscoa cristã emerge diretamente da tradição judaica, com a Última Ceia de Jesus ocorrendo durante a celebração do Pessach. Essa origem comum estabelece uma linha de continuidade entre as duas celebrações, especialmente no que diz respeito ao tema central da libertação de um estado de opressão para a liberdade.

A Páscoa judaica comemora a libertação física do povo de Israel da escravidão no Egito, um evento fundamental na história do judaísmo. A celebração do Seder, com seus rituais e alimentos simbólicos, relembra a dureza da escravidão, a intervenção divina através das pragas e a miraculosa saída do Egito. A ênfase na memória e na transmissão dessa história de geração em geração é um elemento de continuidade que também se reflete na tradição cristã de recordar os eventos da paixão, morte e ressurreição de Jesus.

Além disso, a própria época da celebração da Páscoa cristã coincide com a época do Pessach, ocorrendo na primavera do hemisfério norte. Essa sincronia temporal sublinha a raiz histórica comum e a conexão entre os eventos celebrados. A ideia de um novo começo e de renovação, presente em ambas as celebrações associadas à primavera, também representa um ponto de continuidade.

No entanto, com o advento de Jesus Cristo, a Páscoa cristã introduz uma descontinuidade fundamental em relação ao Pessach. Para os cristãos, a libertação física da escravidão no Egito, celebrada no Pessach, aponta para uma libertação espiritual muito maior oferecida por Jesus: a libertação da escravidão do pecado e da morte. Jesus é visto como o Cordeiro Pascal definitivo (1 Coríntios 5:7), cujo sacrifício na cruz cumpre o significado do cordeiro original e oferece a redenção eterna.

A Última Ceia, embora tenha ocorrido durante um Seder de Pessach, é reinterpretada por Jesus como a instituição da Nova Aliança em seu sangue (Lucas 22:20). Os elementos do Seder, como o pão ázimo e o vinho, adquirem novos significados como símbolos do corpo e do sangue de Cristo, oferecidos para o perdão dos pecados. A ênfase da celebração cristã se desloca da memória da libertação física para a celebração da libertação espiritual e da promessa da vida eterna através da ressurreição de Jesus.

A ressurreição de Jesus, que é o cerne da Páscoa cristã, representa uma descontinuidade radical com a tradição judaica. Embora a crença na ressurreição dos mortos exista no judaísmo, a crença na ressurreição de um Messias crucificado e sua vitória sobre a morte é um elemento distintivo da fé cristã. A Páscoa cristã celebra essa vitória como a prova da divindade de Jesus e a garantia da esperança para os crentes.

Outra descontinuidade reside na compreensão do sacrifício. Enquanto o Pessach relembra o sacrifício do cordeiro pascal como um evento histórico de proteção, a Páscoa cristã celebra o sacrifício único e definitivo de Jesus na cruz como o meio de expiação pelos pecados de toda a humanidade. O sacrifício de animais, central no sistema levítico e comemorado no Pessach, é visto pelos cristãos como tendo sido cumprido e substituído pelo sacrifício de Cristo.

Em conclusão, a relação entre as Páscoas judaica e cristã é marcada tanto pela continuidade quanto pela descontinuidade. A raiz histórica comum na libertação do Egito e a época da celebração representam pontos de conexão. No entanto, a centralidade de Jesus Cristo como o Cordeiro Pascal e a ênfase na libertação espiritual e na ressurreição marcam uma descontinuidade fundamental. A Páscoa cristã, embora herdeira de uma rica tradição, encontra sua identidade única na celebração da vitória de Jesus sobre o pecado e a morte, oferecendo uma nova esperança para toda a humanidade.